terça-feira, 24 de julho de 2012

NÃO EXISTE DEMOCRACIA SEM DEMOCRATAS


Caro Aly, aqui vai uma sugestão de um admirador do seu trabalho. Não entre no jogo do quanto pior, melhor. Você é um profissional da comunicação e não um curioso. não se anivele por baixo. Siga fazendo o seu trabalho. 

Cordialmente,

"Depois de um longo período de partido único, na curta história da existência da Guiné-Bissau como país, deu-se abertura política no início dos anos noventa do século passado, guindada pelos ventos de mudanças que sopraram de fora para dentro. Talvez por isso não tenhamos ainda a maturidade de lidar com certos ditames democráticos. A meu ver, não há uma introjeção da cultura democrática na mente de certas figuras da sociedade guineense. Sem querer dar lição de democracia a ninguém que seja, permito-me o direito de opinar como o cidadão, que na democracia, assim como em qualquer processo quotidiano de um povo, deve-se aprender com os erros do passado.

Para corroborar as minhas assertivas, destaco que depois de abertura política, a falta de diálogo conduziu-nos à guerra fraticida que ceifou milhares de vidas e desorientou severamente o país. Na sequencia de primeiras eleições após a guerra, sem privilegiar a via do diálogo, tivemos um presidente destituído, em 2003, por meio de força, ou seja, mediante um golpe de Estado.

Em 2005, depois de mais um período de transição, elegemos um presidente que acabaria por ser assassinado, no ano 2009, em pleno exercício do mandato, logo após o atentando que vitimou mortalmente o então Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas. No mesmo ano, elegemos um presidente que viria a falecer em janeiro último, vítima de uma doença prolongada.

Para pôr fim à vacatura presidencial, assumiu interinamente o presidente do parlamento, objetivando a realização das eleições presidências, que acabaram por ser interrompidas por mais um golpe de Estado, sob as mais diversas alegações, preterindo mais uma vez o diálogo.

Recorrentemente, ouvimos declarações eloquentes verbalizadas por algumas individualidades que se arvoram em democratas, mas cujas práticas distam a léguas do verdadeiro sentido da democracia. Esquecem-se que, a democracia não é uma mera questão semântica, mas sim, um conjunto de procedimentos constantes, baseados no respeito à vontade popular. Não podemos nos conformar com o cenário de que nenhum presidente eleito ou governo termine o seu mandato. É inaceitável.

Em que pese a nossa democracia ser muito jovem, já deveria emanar alguns sinais de maturidade, por se tratar de uma aprendizagem constante, posto que, melhor que a democracia é só a democracia melhorada. Para isso, precisamos de pessoas com mentes e espíritos desarmados, dispostos a aprender e a ensinar com os seus atos exemplares, sem medo de errar, pois, errar é o humano, evitando assim, cometer reiteradamente os mesmos erros. Devemos ter a consciência cívica de que precisamos respeitar as opiniões divergentes, por mais que a priori, nos pareçam totalmente absurdas.

Devemos ainda entender que, as cores partidárias, todas elas sem exceção, não devem, a pretexto nenhum, sobrepujar os interesses da coletividade. Para isso, faz-se necessária a consciência de que o conflito de opiniões deve cessar no campo da discordância, sem necessidade de uso de expediente antidemocráticos para fazer valer a nossa opinião.  
Todos os episódios acima e mais outros não enumerados, ilustram o quadro de intolerância e desconfiança que se instalou num pequeno país como o nosso.

Não existe alternativa para melhorar o nosso país que não passe pela tolerância, respeito à diversidade de todas as ordens, combate ao espírito de arrogância e prepotência na gestão de coisa pública. Devemos trabalhar constantemente na busca de soluções pacíficas para os nossos problemas, que não são poucos, mediante comportamento e uso de linguagens moderadas, deixando de lado vocabulários agressivos, com tons de intimidação, como forma de fazer-nos respeitar.

Devemos assumir um compromisso com a nação e as gerações vindouras, em construir um legado democrático que torne a Guiné-Bissau um país cordial e menos hostil ao seu próprio povo. Certa vez, estava eu a conversar com um cidadão estrangeiro, originário de um país africano, que fez uma piada sem graça, aduzindo que o “emprego” mais perigoso do mundo era o de presidente da Guiné-Bissau. Mas, entendo que a violência politica recorrente no nosso país é que oportuniza esse tipo de comentários.
Vamos trabalhar em conjunto, sem olhar a quem, para conseguirmos retirar o nosso país do fosso em que se encontra.

Devemos ter em conta que a democracia não se exerce apenas com palavras bonitas, mas com atitudes democráticas. O ativismo democrático não deve ser fruto de conveniência pessoal ou politica, mas sim, um valor inabalável e inalienável, por mais que a conjuntura política nos seja desfavorável.
Por fim, porém, não menos importante, deve-se ter em sempre em conta que, a democracia não se faz apenas com institutos ou arcabouços jurídicos aliciantes, mas também com pessoas democratas, de pensamentos e ações democráticos.
 
Alberto Indequi
Advogado e Empresário"